sexta-feira, 12 de julho de 2013

Opinião – Memorial do Convento de José Saramago

José Saramago
Titulo: Memorial do Convento
Autor: José Saramago

Titulo Original: n/a
Ano de Publicação Original: 1982

Editora: Revista Visão
Ano: 2000
Tradução: n/a
Páginas: 254
ISBN: 9726115604

Sinopse: O romance Memorial do Convento contribuiu decisivamente para a afirmação de José Saramago como um dos mais importantes romancistas do nosso tempo. A sua prosa sedutora configura aqui um mundo assinalado por cruas realidades e sonhos a cumprir. Há a promessa de um rei, um convento a edificar, aqueles que o erguerão, um soldado maneta, uma mulher capaz de visões, um padre que sonhava voar, os autos-de-fé... A história de Baltasar e Blimunda constitui, assim, um marco na obra de José Saramago, que foi galardoado com o Prémio Nobel da Literatura em 1998.

Opinião: Sei que atualmente este é um livro de leitura obrigatória para a disciplina de Português no 12º ano, no entanto nos meus tempos de estudante não o era, e como tal apesar de já o ter adquirido há largos anos foi um livro que foi ficando esquecido pelas minhas prateleiras. Instintivamente quando mencionei que nos meus tempos de estudante não era leitura obrigatória quis colocar "lamentavelmente não o era" mas acabei por não o fazer, isto porque pensando melhor, apesar de hoje o ter apreciado lenta e prazerosamente como convém a este livro, creio que no meu caso aos 17/18 anos  não o teria feito.

Este é um livro que gira em torno da história da construção do convento de Mafra, e da promessa feita por D. João V, e que a partir desse contexto histórico nos dá uma visão muito critica e mordaz da sociedade, religião, politica e costumes do século XVIII em Portugal. Nada escapa ao sarcasmo do autor, desde os autos de fé às touradas, passado pela desigualdade social. No entanto uma boa parte dessa visão é-nos passada por um par de personagens geniais, magníficos na sua complexa simplicidade, Baltazar e Blimunda. Eles são como uma ilha de genuinidade num mar de falsidade, desigualdade e brutalidade. A narrativa tem algumas partes um pouco paradas, mas também algumas passagens verdadeiramente empolgantes ou emocionantes de que tenho de destacar o voo da Passarola, o transporte da pedra para Mafra e o magnifico final que não irei detalhar para não estragar a leitura a quem ainda não o leu.

Já tinha lido Saramago anteriormente, gostei do que li, mas este é para já o seu livro que mais me agradou. É verdade que a escrita de Saramago, apesar de magnifica, não nos facilita em nada a leitura, e só piora quando a versão de que dispomos tem uma letra pequenina e margens curtas como é o caso. Sim, os parágrafos são intermináveis, a linguagem rebuscada, e os diálogos são inseridos na narrativa de forma pouco convencional. É uma leitura lenta, mas depois da estranheza inicial, habituamo-nos e no meu caso considero esta forma única de escrever, genial. Não seria capaz de ler 2 livros de Saramago seguidos, mas como leitura isolada acho-o um autor verdadeiramente fora de serie.

Como já mencionei por diversas vezes gosto de romances históricos, e quando leio um realmente bom, pelo menos em 2 ou 3 passagens dou por mim a pensar qualquer coisa do género “o que eu gostava de ter presenciado este acontecimento”. Pois com este Memorial do Convento a reação foi precisamente a oposta ou seja o meu pensamento foi invariavelmente “que sorte tenho por ter nascido 2 séculos depois”. E é apenas por este pequeno motivo que não vou dar a esta obra a minha nota máxima, porque na minha opinião ela é quase perfeita, mas mesmo apreciando o sarcasmo do autor, penso que por vezes essa sua característica o impede de ver o lado positivo das situações, que pode até ser mínimo, mas… inexistente?

De qualquer forma recomendo a leitura deste livro a todos, mas preferencialmente numa altura em que se encontrem disponíveis e com bastante tempo livre para o apreciarem sem pressas como ele merece.

Termino com 2 pequenos excertos:

"Regressou o filho pródigo, trouxe mulher, e, se não vem de mãos vazias, é porque uma lhe ficou no campo de batalha e a outra segura a mão de Blimunda, se vem mais rico ou mais pobre não é coisa que se pergunte, pois todo o homem sabe o que tem, mas não sabe o que isso vale."
(pág.71)

"Et ego in illo, sim, e eu estou nele, eu Deus, nele homem, em mim, que sou homem, estás tu, que Deus és, Deus cabe dentro do homem, mas como pode Deus caber no homem se é imenso Deus e o homem tão pequena parte das suas criaturas, a resposta é que fica Deus no homem pelo sacramento, claro está, claríssimo é, mas, ficando no homem pelo sacramento, é preciso que o homem o tome, e assim Deus não fica no homem quando quer, mas quando o homem o deseja tomar, posto o que será dito que de alguma maneira o criador se fez criatura do homem, ah, mas então grande foi a injustiça que se cometeu contra Adão, dentro de quem Deus não morou porque ainda não havia sacramento, e Adão bem poderá arguir contra Deus que, por um só pecado, lhe proibiu para sempre a árvore da Vida e lhe fechou para sempre as portas do paraíso, ao passo que os descendentes do mesmo Adão, com tantos outros e mais terríveis pecados têm Deus em si e comem da árvore da Vida sem nenhuma dúvida ou impedimento, se a Adão castigaram por querer assemelhar-se a Deus como têm agora os homens a Deus dentro de si e não são castigados, ou o não querem receber e castigados não são, que ter e não querer ter Deus dentro de si é o mesmo absurdo, a mesma impossibilidade e contudo Et ego in illo, Deus está em mim, ou em mim não está Deus, como poderei achar-me nesta floresta de sim e não, de não que é sim, do sim que é não, afinidades contrárias, contrariedades afins, como atravessarei salvo sobre o fio da navalha..."
(pág.122)


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